quinta-feira, 15 de julho de 2010


No início de novecentos a cultura portuguesa, como aliás de um modo
geral todo a cultura ocidental, debatia-se entre um desejo de modernização, que
se apoiava numa crença optimista nas potencialidades da máquina, e uma
nostalgia de passado ameaçado que desprezava esse presente em acelerada
mutação. O mundo da construção e da cidade reflectiam de algum modo a
dicotomia desse momento de transição, em que os valores artísticos da
arquitectura eram confrontados com a eficácia da engenharia e as possibilidades
dos novos materiais. Por outras palavras, a engenharia insinuava-se como a
"nova arquitectura"8. Ou melhor, no momento em que “a indústria substituía a
arte"9, tendia a cristalizar-se o debate arte-técnica. E assim se separando em
campos opostos o secular percurso comum da arquitectura e da engenharia.
Este afastamento disciplinar que demarcava a eficácia estrutural do
engenheiro da habilidade artística do arquitecto tinha a sua correspondência no
fenómeno epocal e revivalista romântico que dissociava construção e fachada,
verdade do material e ornamento apenso. E, como se verá, a construção encarada como uma composição em partes separadas e aparentemente
autónomas que caracterizou o ecletismo de final de oitocentos não foi só
característico da "grande" arquitectura porque as próprias construções ditas
"ulilitárias" integraram igualmente essa dicotomia.
O Elevador de Santa Justa [foto1], em Lisboa, projectado pelo engenheiro
Raoul Mesnier du Ponsard em 1900 e inaugurado no ano seguinte constitui a
obra paradigmática do novo século. Utilizando, inicialmente, a energia de uma
máquina de vapor celebrava as utopias urbanas finisseculares materializadas
atravès das inovações da técnica. Estabelecendo uma comunicação vertical
entre a Baixa e o Carmo assinalava-se escultoricamente na sua vericalidade
como elemento inovador da cidade, afinal a torre possível da marcação do
progresso. O ferro como novo material de construção era utilizado sem disfarce,
mas expresso paradoxalmente numa linguagem revivalista gótica que buscava a
sua adequação a um tempo e a uma mentalidade que era ainda de oitocentos.
Desde meados de oitocentos que o ferro constituía uma inovação
aplicada à construção das novas infraestruturas viárias. Empregue inicialmente
no quadro da implementação dos caminhos de ferro e utilizado pela primeira vez
entre nós na ponte de Xabregas (1854), as possibilidades estruturais do material
ficariam ligadas duas décadas depois às pontes D.Maria (1877) e D.Luís (1888)
sobre o Douro, ex-libris não só portuenses mas de amplitude internacional como
modelo de resolução de grandes e profundos vãos10. A revelação mediática no
ferro como material de construção ocorreu entre nós justamente no Porto por
ocasião da exposição Universal de 1865 que justificou o Palácio de Cristal
portuense11.Lisboa recebia só duas décadas depois o seu Coliseu (1890) construido
em esqueleto de ferro e integrando na parte norte a Sociedade de Geografia
com a Sala Portugal (1897). Projectada por arquitecto (Mestre José Luís
Monteiro) para ser construída em ferro, tratava-se da primeira sala nobre erguida
entre nós para congressos e conferências. O espaço, entendido para além da
sua imediata funcionalidade, desenvolve-se em tês níveis que circundam o
amplo espaço central da sala que pode simbolizar, muito justamente, a primeira

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